É surpreendente o à vontade com que certos instalados falam, e decidem, sobre a obrigação dos jovens em defendê-los, defende-los a si, aos seus interesses, às suas ideologias, às suas consciências. Veja-se a insensibilidade de alguns (algumas) a comentarem nas tvs estratégias de guerras em curso.

O normalizar os jovens no matar, no serem mortos, estropiados, usados não parece estremece-los; são apenas danos colaterais, dizem – e há quem o diga a sorrir.

Empedernidos por egoísmos e subterfúgios, manipulações e coacções, dispomos dos outros, incluindo os filhos, como objectos sem vontade, sem sentimentos, sem angústias, sem vida. Imolados, afastamo-los, viris, entre hipocrisias, entre medalhas - até à próxima, mais carnívora e brutal, guerra espectáculo.

Aspergido por igrejas, ideologias, culturas, o filicídio encenou-se, acreditou-se altruísmo. Os longos subterfúgios costumam, porém, significar curtas leituras, curtas memórias. 

Daí esquecermos que, às vezes, as vítimas, recusando sê-lo, se viram aos algozes e, ou os aniquilam, ou os substituem. Depois tudo volta, convencionalmente, conformadamente ao mesmo.  

Fernando Dacosta 

A coincidência do senhor super-juiz!

Por obra e graça de uma entrevista ao juiz Carlos Alexandre, descobri que a vida e a Justiça se resumem a 2 títulos de livros de Gabriel Garcia Marquez.

Perguntei: Sente-se "Um General em seu Labirinto"? E ele disse sentir-se mais na pele de "O Náufrago". A entrevista versava sobre um computador que sorteara um processo contra um ex-primeiro-ministro preso pelo super-juiz.

E coincidências? A única falta ao trabalho de Carlos Alexandre, em décadas, aconteceu no preciso dia do tal sorteio. "Se tinha de ser naquele dia, foi naquele dia!" - respondeu. O ´Processo-Marquês` foi entregue a outro juiz, alegadamente adversário de Carlos Alexandre.

Voltemos a Gabriel Garcia Marquez porque ele tem um outro livro que nos pode calhar-na-rifa: "História de uma Morte Anunciada". Será aziago? Claro, porque numa versão portuguesa, não será Nassar a morrer. A vítima será a Liberdade devolvida aos Portugueses há cinquenta anos. 

José Ramos e Ramos


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CAMÕES SUBVERSOR

Jorge de Sena foi, entre nós, quem melhor compreendeu Camões - o que não tem sucedido com alguns dos biógrafos e divulgadores da sua obra. Por interesses, por ingenuidades, por preconceitos engendraram-se à volta do poeta lendas estapafúrdias (devasso, brigão, machista, imperialista, bajulador - o que em certas alturas foi), desvalorizando a sua profunda cultura, cultura caldeada pelos clássicos, pelos marginalizados, pelos subversores, pelos sofredores.

Ousadíssimo, Luis Vaz assumiu nos sonetos alturas únicas entre nós, como nos dedicados ao jovem 

D. Manuel de Noronha ('Alma minha gentil quepartiste..."), morto no norte de África, e de quem fora preceptor; em época de Inquisição incluiu nos Lusíadas o episódio da Ilha dos Amores, hino à liberdade, à sensualidade, de um paganismo fracturante; em fase de delírio nacionalista criou a personagem do Velho do Restelo, voz dos que (ele próprio) avisavam ser problemática a expansão aberta pelo Descobrimentos.

Os colonialistas, se não se retiram a tempo, acabam expulsos e colonizados. Viu-se.          

Fernando Dacosta

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O pópó enfiado em casa

foi chiquérrimo ter uma casa com um popó, enfiado... em casa.

O Bentley do senhor e o Mercedes Sedan da senhora tinham quarto com porta própria. E ao lado dançava-se foxtrot e os miúdos dançariam depois yé-yé para mostrar as máquinas às amigas.

Nas soirėe lia-se António Couto Viana. O'Neil e Natália Correia nem pensar! 

E o elétrico já passava à porta. Era cómodo mas era para o povo, que não tinha pópó. 

O consumo e, mais tarde, a Liberdade deram ao povo dinheiro e o povo também comprou popós. E os senhores? Abalaram nos seus popós 


para para sítios cada vez longe do povo-com-popós. E povo? Foi morar para longe, porque assim podia ter casa e popó. E agora? 

Agora há popós por todo o lado e casas... abandonadas em quase todas as ruas vistosas das cidades. 

E o foxtrot? Tornou-se nome de bar de Lisboa, onde já se dançou tango. 

Mas os senhores já não dançam. Já não estão... deixaram para sempre os seus popós e a belíssima casa em ruínas.

 António Couto Viana também se sumiu. Ficaram O'Neil e Natália Correia.           

              José Ramos e Ramos

Jornais em saldo

Cristiano Ronaldo comprou o jornal mais lido de Portugal, ao preço de um automóvel. Aconteceu meses depois de atirar o microfone de um jornalista desse jornal-TV a um lago.

E assim três linhas dizem tudo sobre a saúde da Imprensa portuguesa.

E qual é a posição dos jornalistas? Oh! Também ajudam à festa, por exemplo, interrompem uma entrevista numa TV, para dar em "directo" a chegada de um treinador de futebol ao aeroporto de Lisboa.

E os repórteres? Fazem jornalismo-de-precaução, disse e bem Baptista Bastos.

E os políticos? Esses põe no Panteão um jogador futebol, ao lado do escritor Eça de Queirós.

E os directores das TVs? Empenham-se em impingir políticos como se fossem comentadores. E dormem colados aos telefones vermelhos ligados aos Tribunais e ao Ministério Público. Dizem tratar-se de "investigação jornalística!"

E os autarcas ajudam? Claro! Pulverizam as cidades, impedindo a distribuição dos jornaisE então? O que fazer?  Pois! Venha um cervejola e Viva o Ronaldo: estamos a regressar (mais velhos) ao ano de 1973! 

José Ramos e Ramos

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A injecção

Tenho um amigo forte, instruído, dono de uma grande empresa no Norte, que vê o futebol e a política como um atraso de 50 anos: fecha olhos à falta muito grave e apoia sempre o Benfica, o Porto e raramente o Sporting.

É o verdadeiro Moço de "A Farsa de Inês Pereira" de Gil Vicente, com 500 anos. Igual ao nosso início há 800 anos, com o filho a bater na mãe.

Crónica de olho no dia!

Temos o ADN de escorregar para o pior. Nos últimos 25 anos fomos infernizados por o Arrogante, o Santo, o Cerne, o Sempre-em-festa, o Pimpão, o Europeu e agora estamos no Consultor Imobiliário. Descemos.

Contra esta besuntaria, ponhamos então os rabos em riste, para a injecção miraculosa dos diabetes contra a gordura. Que é o novel apanágio do meu amigo gordo e o gira-o-disco e toca-o-mesmo do País                 JB

Mandar os velhos para as montanhas?

A escolha, pelo Bloco de Esquerda, de alguns dos seus principais fundadores , Francisco Louçã,

Luís Fazenda, Fernando Rosas, como cabeças de listas nas próximas eleições está a provocar crítica enxovalhantes por  parte de vários comentadores. Não por questões ideológicas (naturais) mas por preconceitos (lamentáveis) de idade. 

A despromoção, a discriminação dos idosos volta, assim, a ser legitimada, fomentada por posturas de crescentes retrocessos culturais e sociais.

Ora "o envelhecimento biológico não significa só por si diminuição de capacidades", sublinhava o prof. Almerindo Lessa, um dos mais notáveis gerontologistas portugueses, "significa apenas, se não houver doenças graves, um abrandamento na velocidade do raciocínio, como quando num automóvel passamos da quinta para a quarta velocidade". 

Até porque ele proporciona patrimónios de vivências, de conhecimentos valiosíssimos, verdadeiramente únicos; até porque hoje envelhece-se menos e mais devagar. 

A maior parte dos inventos patenteados são, note-se, de pessoas idosas. José Saramago ganhou, octogenário, o Nobel , Manoel de Oliveira filmou, centenário, obras de referência. 

É estranha, por isso, a obrigatoriedade de impor reformas a partir dos 70 anos, sobretudo a profissionais altamente especializados, em plena forma física e intelectual; igualmente estranho é ver a idade ser transformada em arremeço contra políticos - fizeram isso com Mário Soares (foi indecente), fazem isso com os conselheiros de Estado ("jarretas", "ultrapassados", "fora da realidade" lhes chamam), repetem-no, agora, com o Bloco de Esquerda.

Será que querem mandar os velhos para as montanhas?

Fernando Dacosta

Liberdade e Opinião, eis a questão!

Um jovem de 14 anos, um líder partidário e um primeiro ministro sofreram, quase na mesma altura, percalços por questões de liberdade de expressão.

O jovem, morador em Cascais, foi violentamente agredido por quatro outros jovens devido à publicação, no seu perfil social, de conteúdos desagradáveis aos agressores; o líder partidário (Paulo Raimundo, do PCP) achou-se ofendido por José Rodrigues dos Santos (excelente jornalista) o haver desfeitiado numa entrevista à RTP; 

o primeiro ministro (Luís Montenegro, do actual Governo) por ter sido insinuado cúmplice em corrupções, ao nível de José Sócrates, pelo Chega.

Os limites de liberdade de opinião e expressão veem-se, assim, questionados por situações diversas, adversas, que a justiça terá, por certo, engulhos no decidi-las. 

À excepção do jovem (repugnante a brutalidade sofrida!), os outros tornam difícil encontrarem apoios pois não é pela repressão que se lida com a opinião, mesmo quando (sobretudo) ela é discutível. 

Paulo Raimundo e Luís Montenegro deviam responder, se possível com humor, sempre possível, ao desconforto sentido. As ideias não se combatem com força, enfrentam-se com ideias - inteligentes.

Fernando Dacosta

Quando um gato afia as unhas num livro

O meu gato adora livros, como Natália Correia gostava de gatos, soube eu através de um amigo. O Umberto Eco também tinha um gato.

O autor do 'Pêndulo de Foucault' forrou as paredes de casa com estantes, onde o seu gato afiava as unhas. O meu já fez isso. E eu achei graça. Pensei, ele osta de livros! Já agora, confidencio: o meu gato teria o nome de Marx, uma graça, mas isso faria comichões às minhas visitas. Por isso  tirei o ´r` e ficou Max!

O meu Max adora a entrada do prédio, não para meter conversa, mas para receber carinhos. Há dias sentei-me ao lado dele, no degrau de entrada, e recebemos apenas três ´boas tardes` em doze passagens de vizinhos. E  carinhos? Nem um.

Devem ter imaginado que o Max também gostava de livros; ou então embirarram por eu ser amigo de um gato ´vira-latas´.

O Max não ligou e eu, ao seu lado, sentado, continuei com  a ler  Eco, semelhante a Fernando Campos em 'A Casa do Pó'. Mas poucos poucos passaram cartão ao escritor português, que foi professor no Liceu Pedro Nunes. Se fossemos 'francius' ou 'camones', era diferente. Por cá a estrangeirada sempre teve palmas, desde pai de Afonso, importado da Borgonha, há 800 anos.      

JRR

José Alves Mendes

Do avesso das coisas. Florença, 1980.

Do avesso das coisas. Florença, 1980.
Lembro os primeiros sonhos. De como o pesadelo de cabeça para baixo sonhava comigo, de como eu em testa erguida assustava o medo. 

De as coisas do mundo não existirem antes do reflexo, sussurre ou não nele o rumor das armas. De pino feito, à beira do Arno, havia núvem escura e céu estrelado de meio da tarde ao saber da corrente, ao traço da água.

E pensei que talvez fosse uma boa ideia fixar o que não parava de se mexer. O que só a água espelhada contava, como um prato de trippe ou um copo de verduzzo a tresandar a arroz acabado de cozer sorvido longe
da terra da mãe. 


São sempre as pequenas coisas que fazem as grandes saudades.

José Alves Mendes

Vizinhos que são cães gentis

Canso-me a falar com os senhores cães, quando vou ao parque fazer um pouco de jogging. 

Nestes meses, desde a minha mudança de casa, conheci no parque o Carvão (cão d'água português), o Hulk ( pastor alemão), o Teco (vira-latas), a Lulu (caniche), o Simão (um rafeiro divertido) e por aí fora. Todos passseados à trela por zelosos donos.

O dono do Carvão tem-me posto ao corrente das maleitas... do Carvão. No caso do Teco falam-me dos traumas de infância. Já a Lulu anda aborrecida com os vizinhos. O Hulk sente-se depremido. E o Simão passou a detestar as viagens de automóvel. Enfim .E vá lá! Qual é o nome dos donos? Não sei. Eu apresento-me ´Bom dia, eu sou o José` e eles respondem `Muito prazer, eu sou o dono do Farrusco`, por exemplo. É assim.

Já tenho até o número de telemóvel de todos, porque estão preocupados que os meus 2 gatos possam ter um súbito mal estar. Que bom! Estou encantado com tantos cães bem-falantes, gentis e... bons vizinhos.  JRR

GARCIA MARQUEZ  ILUSTRA  A MÁ-SORTE  PORTUGUESA

Graças a uma entrevista a juiz, fiquei a saber o seguinte: uma vida ou um sistema judicial resumem-se a 2 dos títulos de livros de Gabriel Garcia Marquez: "Um General em seu Labirinto" e "O Náufrago".

Ou seja vencemos no caos ou desistimos nas agruras, mesmo já com um mão numa qualquer praia.

A entrevista versava sobre um computador atrapalhado no sorteio de um processo sobre um ex primeiro-ministro preso com transmissão directa nas televisões.

Pelo meio veio a pergunta sobre se o tal juiz se identificava com "Um General em seu Labirinto", mas o juiz preferiu "O Naúfrago".

Todas as vidas têm imprevistos e o também tropeçou faltando  ao  


importante sorteio da sua vida. 

Aliás a única falta em décadas de a única falta em décadas de e concluiu assim : se tinha de faltar naquele dia, foi naquele dia!". lá aconteceu o que ja se previa. O processo foi distribuído a uma espécie de rival.

O juiz criara como sempre um mega-processo que já dura para além dos 7 (sete) anos de investigação arrastada.

E qual será o desfecho? 

Um outro livro de Gabriel Garcia Marquez com um título muito premonitório: "História de uma Morte Anunciada".

Mas, creio que numa versão portuguesa, não será Nassar a morrer. Mas sim a Liberdade devolvida aos Portugueses há 50 anos.

José Ramos e Ramos

De quando em vez dá-me o medo de me tornar num homem de sentido único, vulgo de perder quatro dos cinco sentidos. Um pânico de tonto, suponho, mas o que mais me inquieta em perdendo um que seja é a ausência quase absoluta da visão.Que em vendo sinto o ritmo das coisas e dos bichos, o feliz paladar alheio, o toque da névoa e de em emoção não precisar de despejar palavras. Vejo à minha volta os sentidos perdidos. 

Penso nisso sempre que me lamento de andar teso (o que me acontece com uma espavorida regularidade) e exagero em queixume auto-infligido. De em vez de dizer que não tenho 'dinheiro para mandar cantar um cego', admitir que na verdade não tenho um cêntimo para sugerir a um vesgo que assobie, o que é muito pior. 

Escrevo estas linhas em memória de um querido amigo, mais cego que um morcego e que de cada vez que dava um encontrão em alguém sorria de lado, como se uma abelha lhe vivesse em alegria no canto da boca. E dizia: 'sou mesmo parvo, que sempre que saio à rua de óculos esqueço-me de trazeros olhos'

Cegueira sobre o ensaio


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O eixo do ódio



Quem não se radicalizou política e culturalmente não vê substanciais diferenças entre os bombardeamentos da Ucrânia pela Federação Russsa e os bombardeamentos de Gaza por Israel. Ambos matam por igual, civis, mulheres, crianças, doentes, ambos destroem por igualdades,

hospitais, escolas, futuros, ambos cometem crimes contra a humanidade, contra adignidade tornando este um tempo de monstruosas abjecções.

A hipocrisia leva os agressores a, fingindo-se vítimas, propagandearem cessares fogo para intensificarem matanças sob propagandas de covardia. O século XXI está a projectar o que de pior há na natureza humana em barbárie e desmesura, com sequelas terríveis em várias gerações.


O seu contágio em certos sectores (políticos, intelectuais, jornalísticos) é inquietante pelo que revela de subjugações, de redis interiorizados. certas zonas do sul do País realizam-se sessões a exultarem Putin e Trump, com generais a proclamá-los redentores da humanidade, criadores de novas felicidades.

Aliás, os milhares que, indignados, se manifestam na Europa contra Netanyahu não saem à rua contra Putin, apesar dos dois serem, no egoísmo, no deslimite, afins - a eles juntando-se ultimamente, para cartaz do eixo do ódio, Donald Trump, o novo incensado pelos referidos indignados.                   Fernando Dacosta

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Na morte de um alfarrabista amadoríssimo (daqueles de amado)  e figura
de esquina. 

Que como ele sempre dizia: 'não tenho arcaboiço para vir a ser de bairro'.  

Os livros guardam os guardadores de livros. Que em não accreditando nisso eu passava a vida vestido de luto.

Bizantina resiste aos especuladores de Lisboa


À distância de um telefonema, confirmámos a vitória dos alfarrabistas da Bizantina sobre  especuladores imobiliários, matantes de Lisboa. Neste caso (imagine-se!) algum burocrata da Sociedade Histórica da Independência de Portugal (SHIP) a pedir um aumento astronómico de renda de 40 por cento sobre 1500 euros. 

Já passaram 3 anos da anunciada morte. Os especuladores são pacientes. Mas a Bizantina está de pé.Na altura o jornal Público noticiava a vitória: "a Bizantina das Portas de Santo Antão já não vai fechar (porque) como a SHIP já era uma sociedade sem fins lucrativos e, como tal, não (pode) cobrar rendas, ficou acordado pelas partes que a Bizantina  faria um "donativo voluntário trimestral à sociedade". A livraria alfarrabista ficava assim a pagar  4500 euros (1500 por mês) pelo espaço de cerca de 13 metros quadrados e por mais um armazém da mesma dimensão". 

Uma vitória! mas pesada. Estes alfarrabistas são uns heróis. À cabeça está Carlos Bobone.



URGENTE NO PARLAMENTO: LIVROS EM VEZ DE ÉCRANS

Os dias da Assembleia da República seriam  diferentes, se José Lello continuasse a distribuir livros aos deputados.

Todos os anos, pelo Natal, José Lello oferecia uma cabazada de livros, com títulos em função da actividade de cada deputado. Para além da graça, praticava-se o foco, coisa importante para o sucesso das vidas.

Um livro obriga a mente a focar-se num único assunto e desabitua-se de confusões e dichotes

Com um livro à frente, reflectimos no que vamos dizer e nas consequências.

Claro, as convulsões políticas continuarão, por serem inerentes à vida. Os debates seriam assim gentis e produtivos, por serem estribados por livros.

José Lello era generoso, trabalhador e alegre. Faleceu a 14 de Outubro de 2016. Deixou de haver livros oferecidos. Agora só há ecrãs de computador nas bancadas do Parlamento, como num escritório.   JB

como eu aponto as coisas'.

Cozinheiro compulsivo da família, em casa alheia trato de ajudar no que fôr preciso mesmo que a cozinha da vizinha esteja mais suja que a minha. 

Há dias deitei ao lixo lixo que nem era meu: latas de conserva, gargalos de iogurte, voltarenes encarquihados, rolos de papel higiénico sem destino, sacos secos de chá, resquícios de ovos mal cozidos e lascas de sabonete. 

E diz-me horrorizada a dona da casa: 'atiras à rua a minha lista de compras?!'. 

Diz que há gente assim e eu nem sabia: a que nos pede uma lista escrevinhada ou a fixa notelemóvel para melhor ir às compras e aquela outra que deixa pedaços de lixo ao lado do fogão, a meio caminho do caixote, para se lembrar daquilo que tem de voltar a comprar. 

Aprendi a lição. Hoje de manhã vi cascas de cebola no chão da rua e pensei: 'ora gaita, que alguém se esqueceu do bloco de apontamentos'.

Afastem este Fisco!

Há pessoas que dizem temer tanto o fisco, hoje, como a Pide, ontem. 

Se a António Maria Cardoso - sede da extinta polícia - se desmemoriou, foi desmemoriada, os departamentos fiscais, esses, consolidam implacabilidades sem piedade contra milhões de contribuintes –privilegiadamente os da classe média que os da alta …

As razões das vítimas (sujeitas a avarias electrónicas, a marcações prévias para atendimentos, a más caras de funcionários) não encontram a consideração a que tinham direito se a democracia fosse real.

Trabalhar metade do ano para o Estado

Isto num Estado que confisca todo o dinheiro que ganhamos de Janeiro a Junho! Andámos, com efeito, a trabalhar metade do ano para ele, já que o poder nada produz, apenas distribui – para os da sua corte.

Aos impostos directos há a somar, como se sabe, os indirectos, que de pouco nos servem pois vemos despedaçarem-nos direitos adquiridos (na saúde, na assistência, na cultura, na educação, na habitação) e, acintosamente, nos serviços que deviam ser, por direito, de ajuda ao público. 

A violência (legalmente) cometida pela fiscalidade (penhoras de habitações, de pensões, de veículos, de ordenados, de contas bancárias, de terrenos, de partes de firmas, de recheios de empresas, etc, etc.) assemelha-se à cometida pelas ditaduras.

Dois milhões de ordens de penhoras

Só num ano foram, entre nós, emitidos dois milhões de ordens de penhora (53.273 de imóveis), mas nenhuma foi feita por cidadãos contra as dívidas do Estado para com eles.

Se o referido Estado confisca, por incumprimentos, bens aos devedores, estes também deviam poder fazer-lhe o mesmo.

Aliás, é inacreditável que ele, Estado, se preste a cobrar, tal a volúpia que sente nisso, dívidas de instituições e empresas adjacentes.

A textura fiscal é neste momento pior, apesar do cadavérico Simplex, do que há cinquenta anos.

Há quem, em vésperas de eleições, guarde memória disso.

Fernando Dacosta

Natália Correia

Comecei pelos versos dela. Depois por ela ter feito do barroco uma antologia contemporânea sob a chancela da espiral do Escada na Moraes.

Depois tonitruante, voz de carne. Até na 'Mátria' televisiva que tinha da eloquência e em igual dose todos os trejeitos e uma boa maquia das qualidades. Faz hoje 100 anos que nasceu, a miúda de Fajã de Baixo e boquilha à ilharga. 

Fugidia afogueada das suas próprias certezas, nem deus ou diabo lhe hão-de voltar a pôr a vista em cima. Abençoada. ( texto de 13 de Setembro p.p. de José Alves Mendes )

Pansexualidade do feminino

manifestação em Paris de feministas

Dilatando o conceito de feminismo que, nas últimas décadas, tem norteado a luta pela afirmação das mulheres, Natália Correia criou o de femininismo - que vultos marcantes da cultura ocidental, como a escritora Marguerite Youcenar, apoiaram e adoptaram.

A autora de Sonetos Românticos pretendeu com isso alargar horizontes nos que defendem a igualdade da mulher (alguns a superioridade) relativamente ao homem, para reivindicar, como objectivo superior, a dignificação do feminino, feminino que tanto existe na mulher como no homem (bis, trans, pans) pois representa a parte mais sensível, afectiva, criativa do ser humano.

Daí o seu apoio a movimentos defensores de minorias, migrantes, negros, LGBT, ciganos, idosos, sem abrigo, sem justiça; daí a sua reserva a lutas entre sexos como as que surgiriam no chamado #MeToo; daí a sua discordância com as mulheres que, em lugares de poder, imitam, ultrapassando, os comportamentos masculinos num, palavras suas, "travestismo insuportável".

A maior parte de nós, no entanto, não a compreendeu (ainda), não a escutou (ainda). "Tenho tanta coisa a dizer e tão poucos a quem dizer", reconhecia, sempre lúcida, sempre futura, pouco antes de morrer.

Fernando Dacosta

VIVA O REI... E AS SONDAGENS!

Ilustração ao centro da autoria de Raphael  Bordallo Pinheiro

da wikipédia: 

Raphael Bodalo Pinheiro  (Lisboa, 21 março de 1846 — Lisboa, 23 janeiro de 1905) foi um artista português, de obra vasta dispersa por largas dezenas de livros e publicações, precursor do cartaz artístico em Portugal, desenhador, aguarelista, ilustrador, decorador, caricaturista político e social, jornalista, ceramista e professor. O seu nome está intimamente ligado à caricatura portuguesa, à qual deu um grande impulso, imprimindo-lhe um estilo próprio que a levou a uma qualidade nunca antes atingida. É o autor da representação popular do Zé Povinho, que se veio a tornar num símbolo do povo português. Entre seus irmãos estava o pintor Columbano Bordalo Pinheiro

Vou à mercearia de uma senhora romani e ela tem o Chega no coração. Tenho um amigo ´podre de rico`, com vasta herdade no Alentejo, e ele anda metido com o PC.

Os italianos eram mais lógicos, nos tempos do PCI e do PDC:  escolhiam os partidos por tradição familiar. Por cá acontece, mas só no futebol.

A senhora romani da mercearia justifica o seu voto em Ventura, porque ´Portugal tem de ser só dos portugueses`. No caso do meu amigo ´podre de rico`, ele vota PC porque os governos de esquerda serenam a populaça e não fazem nada para chatear os ricos… como aconteceu com Costa. 

Também tenho uma vizinha, com várias graduações e muitas viagens, a querer o regresso da monarquia sumptuosa com um rei bonzinho de bigode. E um João Franco ao leme para meter todos na ordem, como há cem anos. Viu-se o resultado, acrescento eu.

Enfim, com todas estas particularidades, deixem-me confessar: é extraordinário as sondagens raramente falharem nos resultados eleitorais em Portugal.

JRR

Poderes, vacas e pêssegos


Camões dizia que a principal característica do povo português era a inveja; Agostinho da Silva, a manha. Inveja manhosa teria, assim, engendrado os brandos costumes que muitos acreditam ser postura nossa. A realidade histórica e cultural, e cívica revela, porém, a pouca verdade disso. 

Na superfície somos pacíficos, molengões mesmo, mas no interior não. António José Saraiva comparava-nos a pêssegos, aveludados na pele, rijíssimos no caroço. Daí alguns partirem os dedos quando tentam esmagar-nos.

Com essa ambiguidade nos afirmamos e resistimos vai para mil anos, mil anos de violências, fomes, pestes, ludíbrios, perseguições, matanças, fogueiras, roubalheiras, até que, por vezes, o tanque enchia e extravasava.

O século XX foi, aliás, fértil em extravases: matou-se nele um rei, matou-se um príncipeherdeiro, matou-se um presidente da República, matou-se um primeiro ministro, havendo quem lamente não se ter continuado. O anterior, o XIX, conheceu guerrilhas que eliminaram barbaramente mais de 300 mil pessoas. Para trás nem é bom falar.

Temos tentado fintar essa violência (a do Marquês de Pombal contra os Távoras foi cenografada ao horror) cobrindo-nos de véus de névoas, no não dizer o que pensamos mas o que convém, a fim de não irmos parar a galés, a cárceres, a prateleiras, a desempregos, a exílios, a Caxias; no responder nim a tudo, no não desfeitear partidos, lóbis, sacristias,aventais, patrões, no desconfiar que os democratas só dão, aqui, liberdade para concordar com eles, não ouvem os outros, impõem-se aos outros.

Cedo percebemos que do poder, sobretudo central, não costuma sair grande coisa, apenas cobradores de impostos, fiscais do pensamento correcto, arregimentadores de mancebos para guerras, impositores de estatismos, burocratas de corrupções. Ser-se despótico com osdebaixo, subserviente com os de cima é estrada para sucessos, quer dizer, para tachos. 

Papas,bolos, respeitinhos são portas de entrada na corte. Há já quem diga que Portugal é uma república monárquica. "Se os meus actos coincidissem com os meus pensamentos há muito que eu estava nacadeia", sintetizava o grande Raúl Brandão.

Quando nos pressentia depressivos, Agostinho da Silva alentava-nos, "vá, reajam, os poderes não passam de vacas, devemos dar-lhe palmadinhas no rabo e tirar-lhes o leite possível, épreferível, aliás, que sejam vacas a touros"

Fernando Dacosta

O OVO DA CENSURA

Os ataques aos jornalistas (ameaças, processos, controles) surgidos ultimamente entre nós por parte de vários dos actuais políticos - políticos sem golpe de asa para as funções que ocupam – estão a condicionar de novo áreas fundamentais à liberdade de expressão e opinião. 

Tal era, no entanto, previsível dada a presente situação do País e o pendor, nele, para a manipulação, para a desresponsabilização.

Generalizou-se, aliás, a ideia de que a Censura acabou no 25 de Abril.  Não acabou: foi privatizada, isto é, deixou de ser exercida por organismos do Estado para ser, sob outros nomes, por gabinetes de múltiplos poderes.

A CENSURA NÃO-ASSUMIDA


Antes do 25 de Abril não havia, note-se, uma Censura, mas duas – a Censura (assumida) da direita, nacionalista, moralista (do Estado Novo), e a Censura (escamoteada) da esquerda, internacionalista, neo-realista. 

Com a Revolução a primeira foi trespassada, a segunda reforçada. Resultado, a hecatombe - de leitores, de suportes, de isenção, de autonomia - do actual jornalismo, eclipsado por uma comunicação social que não se sabe muito bem o que é: serão os comboios, os telefones, os pombos correios? perguntava, sarcástico, Baptista-Bastos.

Há quem, maldosamente, a veja (à comunicação social) como uma espécie de guarda-chuva, ou guarda-sol, branqueadora de manipulações, corrupções, explorações e outros 'ões' afins.

Como em democracia parece mal matar os mensageiros, o que se fazia em épocas muito recuadas (não tanto como isso) passou-se a neutralizá-los tornando-os, sobretudo por via económica, obedientes e dependentes, sem protecção, sem intervenção, sem opinião. 

As ditaduras controlam pelo silêncio e pela repressão, as democracias pelo chinfrim e pela sedução; as primeiras gostam de utilizar militares, as segundas comunicadores.


SURREALISTAS AFASTADOS


A Censura do Estado Novo, selectiva, implacável, visava acima de tudo apagar os que figuravam nas suas listas negras, sobretudo se ligados ao Partido Comunista Português, a força verdadeiramente temida pelo regime. 

Quer escrevessem sobre flores ou sociologia eram, não por intervirem mas por existirem, cortados.

O controlo da esquerda exercia-se nos jornais a partir, especialmente, dos suplementos, caso dos culturais e económicos. Particulares vítimas de ambas foram os surrealistas (anatemizados, exilados), os católicos progressistas (embora amparados pelo Cardeal Cerejeira), os fracturantes (em semiclandestinidade), os da extrema esquerda (por incontroláveis) e, na fase final, os desertores da guerra colonial. 

Salazar, apreciador de jornais e jornalistas, tinha (alguma) má consciência ante eles por causa da censura. Dizia mesmo ter sido, em Coimbra, "vítima dela". 

JORNALISTAS PERDERAM O QUE GANHARAM


Daí tentar compensá-los (amaciá-los) com privilégios relevantes na época, como uma assistência médica gratuita de grande qualidade, através da Casa da Imprensa, como 50 por cento de descontos em todos os transportes públicos, como cedências de terrenos para vivendas próprias (as cidades dos jornalistas em Nova Oeiras e Carnaxide), etc. tudo anulado depois do 25 de Abril.

Logo a seguir à Revolução, os novos poderes tiveram a peregrina ideia de entregar um jornal a cada partido, o que, de imediato, abarrotou as redacções de comissários políticos, de controleiros, de manipuladores afectando gravemente a credibilidade da informação – jamais reposta.

Os títulos que tentaram resistir ou foram fechados (caso de O Século e das suas publicações, Século Ilustrado, Vida Mundial, Modas e Bordados), ou foram sabotados, caso do Diário Popular e do Diário de Notícias com tiragens, então, na ordem dos 100 mil exemplares diários. 

OS JORNALISTAS ESTÃO PRECARIZADOS

Leis que obrigavam os directores a serem jornalistas com mais de cinco anos de profissão, queatribuíam aos Conselhos de Redacção poderes vinculativos, que impunham cotas para estagiários foram atiradas para o lixo. A precarização e a proletarização mancharam todo o sector. 

A via económica tornou-se a grande tesoura da democracia. Natália Correia, que foi jornalista (no Diabo) advertia ser "tão censurante o impedir de dizer como o obrigar a dizer" (texto que devia figurar em todas as redacções, gabinetes, ministérios, escolas – mas não figura), pois o obrigar a dizer abre portas a todos os populismos e manipulações, e fack-news. Em comunicado recente, o Fórum Internacional de Jornalistas, Escritores e Editores alertava dizendo "enganarem-se aqueles que acreditam só haver em sociedades totalitárias ou autoritárias censura à liberdade de escrever, ler, editar.

Nas outras sociedades, as democráticas, multiplicam-se mecanismos de autocensura através de pressões políticas, económicas, sociais, culturais de igual modo perigosas e devastadoras".Há 100 anos Raul Proença escrevia na Seara Nova que "chamamos liberdade de



CENSURA ESTÁ HOJE PRIVATIZADA 



texto censurado antes de 25 de Abril de 1974

(Jornal O Século encerrado para reestruturação no tempo do socialista Manuel Alegre e nunca mais abriu)

(Raul Rego à janela do jornal República - tendência socialista- contra a censura dos tipógrafos)

 imprensa ao direito que têm certos potentados, graças à sua fortuna e suas chantagens, de influir na opinião pública" - Tem-se visto. O ovo da censura continua, independentemente dos regimes, a chocar autoritarismos multifacetados.

Fernando Dacosta

Hipersónico é o meu dormitar.
O meu ressonar só é mensurável pela escala de Richter, ao que dizem as amadas que em infelicidade tentaram adormecer ao meu lado nos últimos 45 anos. Aventuras de casa-de-banho de hotel, varandim de pensão, corredor de hospedaria, armário de quarto, taque-tuque-taque de comboio nocturno, garagem da casa do pai, cave da casa da mãe. Sempre empurrado para estar acordado por perto na condição de ir dormir
noutro lado e longe. Aproveito a oportunidade para pedir perdão das noites perdidas. as delas às minhas e as minhas às delas. Que se já tentaram sonhar contra os pesadelos em acotovelado na banheira ou despertado a murro como a batata regressada do forno... Em homenagem à garina que embriagada de generosidade mex perguntava vai para trêsquartos de hora: 'e como é que alguém como tu ainda é solteiro?'. Pois, pois.

usando telemóvel ou tablet cique no canto superior esquerdo para ver as outras páginas



Lembro-me de aos 12 anos rabiscar em diário de chave e cadeado que a perfeição não é fazer tudo bem: é parar de fazer as mesmas asneira

recebi 2025 no colo apensar  que demorei meio século até garantir que tudo o que extraviei dormita no lugar certo. Agora só falta acordar o que adormeceu. 

A ver se dá tempo, que no fim das contas o que nos une são as diferenças. Se não acreditasse nisso a esta hora já seria pó e cinza ou quase nada. A seco insisto em professar uma fé sem manda-chuvas. 

E ainda por cá estrebucho, entre cruz e xis e sob o gizdo céu, pau-mandado da regra de ouro que reza:'não há mal que sempre dure nem bem que sempre se ature'.

"NÃO PAGAMOS"


O dono de vários grandes super-mercados, em entrevista, acusouca classe política de viver na babugem dos impostos.

Mas não disse que ele vive à conta de margens de distribuição e do esmagamento dos produtores nacionais. Para tal dono, a solução está na isenção total de IVA em bens essenciais. E pronto.

Nem revelou que os impostos da sua empresa são pagos no Países Baixos, por ser mais barato.

Também não aflorou o valor do seu ordenado superior em 280 vezes o salário mínimo

do  seu empregado mais simples.

Esqueceu-se ainda que, nos dias de hoje, 75 por cento da nossa comida é distribuída por hipermercados, que assim asfixiaram o comércio local. 

E também que os  trabalhadores dos  hipermercados estão a ser substituídos por máquinas de self-pagamento.

Devíamos era seguir Dario Fo na sua peça teatral e gritar bem alto:"Não Pagamos, Não Pagamos". 

Só pagaremos impostos na Países Baixos e não compraremos  comida em hipermercados. E seria possível? 

Com 75 por cento da nossa alimentação na mão dos hipermertcados... Não.

M. Castro

A pianista Maria João Pires e o barítono Matthias Goerne, dois extraordinários intérpretes da obra de Franz Schubert, interpretam Viagem de Inverno, um dos mais fascinantes ciclos de canções escritos pelo compositor austríaco. 

Dedicado à figura romântica do viajante, que atravessa um inverno habitado pela dúvida e pelas memórias, este ciclo é um exemplo sublime da elegância dos Lieder de Schubert. 

Depois das Schubertiades que recriou na temporada passada no Grande Auditório, Maria João Pires encontra agora em Goerne o cúmplice ideal para uma nova jornada schubertiana. (do site F. GulbenKian)

Maria João Pires toca na Torre de Marfim


Era de esperar. O anunciado concerto de Maria de João Pires esgotou-se rapidamente. Só não se compreende os preços elevadíssimos, de 28 a 70 euros.

A provável primeira resposta será: o concerto é para amantes e entendidos. E nós acrescentamos que a Fundação foi obra de um rico petroleiro, que poisou em Portugal por misteriosa causa.

A segunda resposta será talvez: estando o concerto esgotado, é porque não é caro. Pois! 28 euros para uma família?

Ao menos transmitam o concerto pelo YouTube. E deixam de se queixar que a malta está sempre de olhos nas mensagens e jogos do telemóvel.

Ou querem continuar a viver numa Torre de Marfim?   JB



(No telemóvel ou tabet, para outras páginas, prima os 3 traços canto superior direito)

Do avesso das coisas. Florença, 1980.

Lembro os primeiros sonhos. De como o pesadelo de cabeça para baixo sonhava comigo, de como eu em testa erguida assustava o medo. 

De as coisas do mundo não existirem antes do reflexo, sussurre ou não nele o rumor das armas. De pino feito, à beira do Arno, havia núvem escura e céu estrelado de meio da tarde ao saber da corrente, ao traço da água.

E pensei que talvez fosse uma boa ideia fixar o que não parava de se mexer. O que só a água espelhada contava, como um prato de trippe ou um copo de verduzzo a tresandar a arroz acabado de cozer sorvido longe da terra da mãe. São sempre as pequenas coisas que fazem as grandes saudades.

Dois grandes amigos partiram

Escrever uma linha numa página branca, foi sempre o diabo para mim. Por isso tinha dois peixes vermelhos, que todos os dias me esperavam na sala. Então eu começava com o nome de um deles e depois zás! já me sentia a nadar.

Quando mudei de casa, continuei a limpar o aquário. Cinco vezes por ano, repetia e na repetição lembrava-me de ainda miúdo a entrevistar - para o jornal escolar Cntacto,- José Cardoso Pires e dele dizer ´estamos sempre a escrever o mesmo livro`. E eu achava graça peixes, à escritae aos escritores.

Há dois anos, o peixe vermelho morreu, de forma inesperada, como se fosse texto apagado; e depois nos conformamos pensando estar numa pen ou drive. Senti aquela morte como um virar de página.

Ficou o peixe laranja e decidi há dias comprar um aquário lindo, com filtro especial e o peixe laranja morreu. Sem mais! E para mais em vésperas da compra um barco. Morreu na companhia de um amiguinho, comprado há meses para lhe fazer companhia.

O peixe laranja nunca se recompôs do desaparecimento do seu amigo peixe vermelho. Já nem vinha sequer comer ao cimo, como ambos fizeram durante largos anos, com grande alegria. Eram felizes e acreditavam em mim.  

Em resumo eu não devia ter limpo o aquário há dois anos, nem devia ter comprado um aquário novo no senhor chinês. 

Lamento, tanto. Eram meus companheiros. Eu sntava-mse frente ao aquário e contava a minha vida e eles entendiam. Foram-se, 'já não estão', como disse Saramago.

O aquário ficou vazio. E os textos doem mais.        jrr

Dos mortos do dia.

Não é que em data oficial de defunto eu espere que a chuva graúda dê a boiar as almas perdidas, como se chegadas tarde a um encontro prometido. Aos mortos confunde-me não saber se me tomavam por faltoso fosse a história contada do avesso, como é certinho que um destes dias será. A segunda à esquerda, acho eu. Ou a primeira à direita.

Lembro-me de haver uma rotunda mas não sei se era só para confundir. Ou se as voltas foram feitas para trocar o destino ou se assim devo chegar a outro lugar, diferente daquele do qual parti nesse começo apontado a nenhures. Que ir faz mais sentido que ter de voltar. 'És um parecido entre os desaparecidos', como uma miúda em tempos idos os teve no sítio para dizer da minha alegada condição.

Só gosto que chova, que me resvale na careca o aguaceiro, que bufem perdigotos de gelo enquanto conto os metros até chegar a casa. A de alguém, em me faltando uma que me chame pelo nome como se em teimosia o sítio só proclamasse os nevões.

De não esperar melhor paragem que o último bairro. E sabendo eu rir da matreirice pregada ao mais cabotino dos fados, não haver um pingo de sentido numa verdade desse tamanho. E que só no fim fique quieto, no lugar onde deveria ter ficado em pulgas.

 A Milão do quarto de hora

Apercebi-me à minha quarentena de anos que, quando em viagem, em vez de ir voltava ao lugar. Que escolhia a nostalgia em vez do exotismo, os favores do regresso em vez da curiosidade. E tinha os meus achaques. Em Milão, por exemplo, vadiava em fidelidade pela igreja de Santa Maria delle Grazie. é onde está o fresco do Da Vinci, 'A Última Ceia'. 

De passar por uma trindade de portas calafetadas, do marmanjo me dizer: 'respire, mas devagar'. De ciclicamente haver um
novo restauro por conta do Leonardo se ter posto ao fresco e, julgava
ele, se ter pirado a tempo. E quando lá volto começo pela parede
oposta, a 'Crocifissione' do Monfortano (1460-1502) a que ninguém liga
patavina. Lembra-me o marmanjo dos museus do Vaticano cujo trabalhinho
era dizer 'ssshhh, ssshhh' dez vezes por minuto à malta que com perigo
de torcicolo sem se calar se espantava com o tecto da Sistina. E
reclamava ele: "qual é a parte da palavra 'capela' que vocês não
percebem?!". Aquilo a que a mais nova das minhas sobrinhas (Mendes
Solnado de apelido, que lá por casa não brincamos em serviço) acenando
a mão à frente da cara como um pára-brisas chama o 'momento daaahaaa'.

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Do fim do princípio do SNOB


Sem ofensa a Guimarães, o meu Portugal nasceu aqui. A luz afogueada sobre a relva, o esbracejar benfazejo da dona Maria, o esgar sabedor do sôr Albino. Dos hábitos iluminados nas prateleiras como vícios prometidos. 

De, em mal cheio de tudo o que enche, o todo dar pelo nome de 'refill'. De nunca ter de armar ao fino para enfartar o bruto. Da música ambiente ser feita de notícias frescas, azedumes de afeição, azedas doces e gargalhares. De sermos da mesma matéria sob o lusco-fusco... 

Está vendido. Há quem entre pares diga que o amanhã há-de ser parecido à noitada de ontem. Que a coisa parecida vai dar pelo mesmo nome. Não me entristece discordar. Só desejo que quem tanto nos agraciou descubra ou confirme os prazeres da vida depois do SNOB.
E que o lugar em mudando de mãos não mude em mais nada. Ou em mudando fique tal e qualmente. Que a ter de mendigar, pedincho a coisa inteira.

Especificações  em letra 8/8, e letra branca em fundo amarelo!

Vi o "Homem Invisível", escrito de H. G. Wells, ainda pequeno, na TV a preto e branco, e ...descubro agora uma certa semelhança com os rótulos de produtos à venda nos supermercados portugueses. Desculpem mas sinto mesmo.

O "Homem Invisível" voltou aos ecrans em 2020, cheio de um apavorante terror, escrito e dirigido por Leigh Whannell, depois de ter estreado na Universal Studios em 1933. Quase 100 anos depois.

Mas o seu ´modus operandi`espalhou-se pelos hipers-mercados portugueses. Sim, é mesmo isso!

O rival do 'Fugitivo´

O"Homem invisível" rivalizava com a série "O Fugitivo". E parece-me ter sido um espécie de aviso global. que assentou como uma luva no nosso País: "deixem-se de ideias, seus ceguetas!". E a malta deixoiu de se meter na política. As gentes ficavam cheias de medo da PIDE".´Mas é a mesma arrogância  dos dias de hoje. Um género de vira-o-disco e toca-o-mesmo dos cenários políticos, moendo-se e remoendo-se.

Felizmente  já não há PIDE, mas,  por curiosidade, afinal já existem 19 entidades que podem, por exemplo, escutar os nossos telefonemas, desde Fisco a uma Esquadra da PSP de bairro. Basta o simples  pressuposto falso de sermos alegadamente traficantes de droga ou coisa assim e pronto: telefone son escuta.

Para que servem as escutas

 O juiz não tem possibilidade de verificar detalhes e mais não pode afzer do que confiar np requerente e zás!… lá está o tal programa ´Pegasus´ ou primo do mesmo. 

E para que servem afinal essas escutas? Perguntem a  Jorge Silva Carvalho! Receio que servem mais para chatear do que ganhar na barra dos tribunais. Falemos assim para semos finos.

Em boa verdade, nem queremos saber para que servem as escutas telefónicas aos outros.  Estamos mais interessados no dia de amanhã, quando levamos os miúdos à escola ou nos engarrafamos em filas intermináveis. Tudo por causa de um arquitectos alegadamente mancunenados  com quem nos atira para um apartamento nos subúrbios porque os ricos e os politicos querem apropriar-se do centro das cidades. E depois dá crédito para  pópós e lá andamos todos os fim-de-semana na "volta dos tristes"... em Lisboa e no Porto.

Digam-me, é justo uma cadeia de supermercados (que domina fornecimento da comida aos portugueses em 75 por cento) colocar nas usas prateleiras um produto miraculoso... com rótulos impossíveis de ler?

Está claro a macaquear os consumidores. Ou insiste ´remake' (rasca) do "O Homem Inviável pondo à prova a nossa paciência?

Nos últimos 50 anos, a evolução das nossas cidades ficou nas mãos de arrivistas! 

Isto não tem nada a ver com as razões (escondidas) Ventura. Que se lixe o homem que ese apoia em especuladores imobiliários e vendedores de armas..

É um simples lamento nozes quando se esvaem as nozes que a Europa  nos dá. 

Pelo menos metam letras grandes nos rótulos dos produtos de super-mercado? Já ficávamos mais confortados.

josé ramos e ramos

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O cansaço do homem actual

O grande fenómeno em curso no chamado primeiro mundo é "o do cansaço do homem actual", comentava no Botequim, em madrugadas de poesia e profecia, Natália Correia.

Milénios de trabalho, de lutas, de matanças, de destruições extenuaram-no. A gestão por si feita da humanidade salda-se emincríveis abominações – e crescentes perspectivas de aniquilamento do planeta.

Poder feminino

"Só conseguiremos evoluir se o poder for entregue ao feminino", acrescentava Natália, "o feminino existente nas mulheres, nos homens, no bis, nos trans, nos anatemizados".

As suas palavras ora gelavam, ora incendiavam, não se faziam cinzas nem sarros - daí interrogar, interrogar-se se estávamos preparados para a grande mudança.

Que diria ela hoje de lideranças como a da senhora Von Der Leyen, presidente da Comunidade Europeia? e a da senhora Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu? e a da senhora Kristalina Georgieva, directora do FMI? e a da senhora Giorgia Meloni, primeira ministra de Itália? e a da senhora…?

"Não sei adaptar-me aos tempos que correm", desalentava-se. "Há pessoas que não são vocacionadas para este existir, eu sou uma delas!"

Retrocessos avulsos

Muitos dos avanços conseguidos nas últimas décadas - controlo de enfermidades, aceitação de diferentes, de sem território, de sem sujeições ao instituído - retrocediam.

Não íntegros, dirigentes perdem credibilidade; não amadas, mulheres sucumbem agredidas; não tolerados, os livres tornam-se perseguidos; não considerados, os idosos sentem-se desperdícios; não reconhecidos, os jovens empacotam exílios avulsos; não apoiados, os casais substituem filhos por animais de companhia.

Povos de democracias angulares agredem migrantes, refugiados, negros, ciganos, homossexuais, velhos, doentes, apátridas, crianças, inculcando-lhes a dor de não merecerem existir; países soberanos invadem países soberanos, arrasam cidades, chacinam populações, provocam fomes, doenças, ódios. Insaciáveis, geram gente inerte, tendente ao suicídio e a distorções mentais – e ao terrorismo.

Guardanapos de papel 

Cientistas falam de novas pandemias causadas por retracções na saúde, na investigação, no crescer da miséria, da desigualdade, da subnutrição, da desesperança.

Pouco antes de morrer Natália, em guardanapo de papel, escrevia que "quase nada vale a pena/ mesmo que a alma não seja pequena/ Aliás, só as almas grandes são capazes de perceber o pouco que ainda vale muito a pena/ o amor, a liberdade, a criatividade".

O problema é que, na sua perspectiva, "o produzir, o consumir, defendidos pela cultura patriarcal", alienam "a capacidade para o amor, para a liberdade, para a criatividade".

A crise em que estamos comprova-o. E Natália afasta-se: "Prefiro desaparecer a submeter-me".

Desapareceu e não se submeteu.


Fernando Dacosta 

 

fotos do Botequim já depois de Natália Correia

2 milhões  de  portugueses  vivem  na pobreza


A nossa democracia, adulta por fora mas não por dentro, foi contaminada por ideólogos, à esquerda e à direita, que lhe desmaiaram as cores e a luz. 

Os que entre nós resistiram às ditaduras sofrendo-lhe as agruras, apanham agora com os contentinhos do regime (e da oposição) a pretenderem, sob mantos eleiçoeiros, a aliciá-los.

A democracia, esta, funciona apenas relativamente ao poder político - o único que depende de urnas – já que ninguém vota nos outros, económico, financeiro, informativo, judicial, educacional, etc.

Portugueses pagam dívidas que não contraíram

As pessoas estão a conhecer situações de extrema apatia. Em excesso por todo o lado (há jovens a mais, adultos a mais, idosos a mais, doentes a mais, estranhos a mais), elas veem-se depreciadas para lá do aconselhável.

Quando se julgava que a justiça social se aprofundara, eis que surgem ameaças devastadoras: falência da segurança social, incerteza nas reformas, amputações na saúde, desvio de verbas para a defesa, para pagamento de dívidas externas (que os portugueses comuns não contraíram).

Pervertidos por corrupções, impunidades, tops, audiências, sondagens, os mecanismos de protecção estremecem em cadeia.

A divisa é agora não provocar ondas 

Dificilmente se viu na sociedade portuguesa tanto desequilíbrio, tanta classe média destroçada, tanta gente a dormir nas ruas, tanta oferta de prostituição, de submissão.

A competência profissional é inútil, a honradez pessoal inconveniente, a dignidade cívica inoportuna. Não provocar ondas tornou-se uma divisa.

O fosso entre as pessoas agiganta-se. Governantes, governados, pais, cônjuges, colegas comportam-se como se o outro fosse um rival, um inimigo, um objecto a comprar: compram-se filhos, apoiantes, votantes, governantes.

O fracasso fez-se uma nova, outra, peste; tornou-se um opróbrio, como a pobreza, a doença, a velhice, a deficiência. Temos multidões de expropriados por impostos.

Expropriados por impostos

Caminhamos para clubes, para raças de eleitos, de herdeiros (nas famílias, nas empresas, nos partidos, nos lóbis, nas camas), brancos, ricos, elegantes, poderosos. Quem fica isolado, quem não logra acesso ao êxito, é porque não o merece, porque não é dotado, nem diligente, nem imaginativo.

Fora do palácio da corte, as multidões diariamente, expropriadas por impostos, desacolhidas das habitações (que se não constroem), dos hospitais (que se não reformulam), da cultura

 (que não democratiza), da ética (que se não acende), da solidariedade (que se não preserva)

A criação já náo tem valor

Depois das ilusões do 25 de Abril, da Comunidade Europeia, do socialismo, da democracia cristã, do liberalismo, caímos no aturdimento (trabalho, televisão, futebol, bar, automóvel, moda), uns, e no alheamento (desemprego, doença, exclusão, miséria, desesperança) outras.

Pessoas refugiam-se nos comprimidos

A ressaca, da ideologia revolucionária à liberal, é constrangedora. É-se apreciado pelo que se diz, não pelo que se faz; é-se retribuído pelo que se exibe, não pelo que se cria. Estoira-se de angústia mas afirma-se que tudo vai bem. 

A percentagem de depressivos e de suicidas (de suicidados) explode. O recalcamento do íntimo, do espiritual, dissolve-nos.

A arrogância e a crueldade, a megalomania e a desumanização alteram, debilitam os sistemas imunológicos dos indivíduos e da sociedade

Cada vez mais nos refugiamos no soporífero, no excitável , no sobrenatural, no consumismo, nas drogas, nos recusamos a pensar, a intervir.

Dois milhões de nós (20 por cento das famílias) vivem no limiar da pobreza; 18 por cento das crianças encontram-se em estado de fragilização. 

Continuamos a ser dos países mais pobres da UE, de maior clivagem social e afectiva.

A Democracia não é um ponto de chegada

Durante muito tempo a sociedade dividiu-se, segundo a concepção de cada um, em duas metades: a da esquerda e a da direita, a do executivo e a da oposição, a da ética e a da traficância, a do controle e a da subversão.

Depois passou a cindir-se em (novas) duas partes: uma, a mesma, a do governo e oposição, dos partidos e imprensa, das polícias e tribunais; outra, a dos cidadãos independentes, a dos grupos que procuram alternativas fora das malhas do correcto.

É nesta que se gera o futuro.

Maria de Lourdes Pintassilgo, uma luz passada na nossa esperança, alertava-nos em madrugadas do Botequim, que a democracia era um ponto de partida, não de chegada – se o não o percebermos, perdemo-la, perdemo-nos.

Fernando Dacosta

Mário Soares: uma das fotos mais emblemáticas de sempre quando puxam pelas "bochechas", o político que nos conduziu pelos labirintos da História 

Freitas do Amaral, com uma  voz de "santo", manteve a direita viva no reboliço da Revolução, mais tarde filiou-se no PS e foi presidente da Assembleia das Nações Unidas

Álvaro Cunhal, o comunista programático, a quem Oliveira Salazar permitiu exames universitários em Direito na prisão, com notas altas, só mais tarde igualadas por Marcelo Rebelo de Sousa

António Ramalho Eanes, o general que saíu da brumas para dar sentido à Revolução e o peito às balas, em pleno tiroteio no Alentejo

Nos primeiros tempos pós 25 de Abril, ainda os partidos não infantilizavam os eleitores, o País viveu um dos períodos mais exultantes, mais desconcertantes da sua história. À solta, os portugueses assumiam afectuosidades e delírios sem medida, sem controles.

Isso foi especialmente visível nas campanhas eleitorais para o Parlamento (inesquecíveis as da Assembleia Constituinte) e para a Presidência da República.

Candidatos e eleitores, militantes e populares fizeram-nas espectáculos insuperáveis de alegria, de intervenção, de manha, de oportunismo. O grande teatro trocava os palcos pelos palanques, os políticos faziam-se actores – e que magníficos alguns o eram.

O contacto com o povo dito profundo, e deste com os seus novos representantes, tornou-se fremente, a fantasia a correr nos comícios, nas arruadas, nas páginas dos jornais, nas sessões da Assembleia (recordem-se os períodos de Antes da Ordem do Dia), nas esperanças de um futuro a chegar – um futuro, profetizava Natália Correia, sonhado muito antes.

No terreno não havia, então, previsibilidades, racionalidades; ficções, sim, promessas, sim. Sim. Vendavais de vitalidade volteavam o país e a cabeça das populações no que tinham de mais recalcado.

Eufórico, Mário Soares entrava no autocarro do PS (imitado do de Mitterrand) sob apoteoses: "Estes já estão no papo!", exclamava – não sabendo, porém, que tais apoteoses eram maliciosas, que os entusiastas delas iam, depois, para as tabernas maldizer os por si acabados de bajular; que, velhacamente, trocavam de autocolantes, de galhardetes, de punhos a erguer consoante a natureza do partido em itinerância.

Mário Soares, o mesmo, vê-lo-íamos depois no Algarve a beijar crianças de flores nos sorrisos e, distraído, a pegar num anão e a beijocá-lo mecanicamente .

Ramalho Eanes, nas primeiras presidenciais, a espantar o País (depois de o resgatar a 25 de Novembro) ao subir, ante tiros disparados contra a sua caravana, para o tejadilho do carro onde seguia (Manuela Eanes a segurar-lhe pela janela as pernas para não cair) enfrentando adversários sem rosto nem decência.

Álvaro Cunhal a chegar, noite alta, a Baleizão ante lamentos de mulheres por os filhos se terem "passado para o outro" – o outro era Cavaco Silva; a ouvir a jornalista Helena Mensurado perguntar a uma adolescente se sabia quem era Catarina Eufémia: Não, é uma cantora rock?

Francisco Sá Carneiro, detendo poderes de transfiguração, em palco (como Cavaco Silva), a galvanizar multidões; Diogo Freitas do Amaral entronizando romarias pagãs a caminho de Belém; Otelo Saraiva de Carvalho abrindo azuis em bairros de lata e de lama; Pinheiro de Azevedo, o inesquecível almirante sem medo, resmungando anátemas contra sequestros e coacções; Maria de Lourdes Pintassilgo, entre Manuela Eanes e Natália Correia, espalhando humanidades por seguidores em espera de partilhas.

Francisco Lucas Pires, o mais imaginativo, o mais selectivo político português da época conquistando, pela inteligência, pela autenticidade jornalistas de liberdades (Vicente Jorge Silva do Expresso, Fernando Diogo do Diário de Notícias, Fernando Semedo do Diário, Rogério Rodrigues do Diário de Lisboa, eu próprio de o Jornal) através de notáveis intervenções que o excepcionalizaram culturalmente - e o fracassaram politicamente (no CDS). O seu erro foi não se ter filiado no PS e não se ter recusado ir para Bruxelas.

Tudo isso passou. As campanhas perderam calor e sal, pilhéria e malandrice, tornaram-se insípidas, tecnocratas, chatas. Arredaram o Eça (das fabulosas Campanhas Alegres) encafuando-o no horroroso Panteão de Santa Engrácia, numa Lisboa que ele ridicularizaria à apoplexia. Só falta agora, para descanso final, meterem lá de vez os restos que restam do 25 de Abril. 

A Europa vai afogar-se no Islão, senão puser travões ao trafico de seres humanos e ao branqueamento de capitais. Incluindo Portugal.

Há muito tempo, p escritor norte-americano Daniel Silva lançou o alerta. Pareceu-me ficção ao serviço de Tel-Aviv e do seu personagem herói Gabriel Haom, sobretudo em "Morte em Viena" e na sequência dos 4 livros seguintes

Mas mudei de ideias, ao ver imagens do Largo Moniz repleto com largas centenas de homens ajoelhados em direcção a Meca.

Na Europa somos felizmente um Estado laico, ao contrário da Grécia ou da Bósnia. E depois de se reduzir as procissões Católica, só nos falta aumentar as manifestações islâmica.

O Islão tem um atraso civilizacional de 600 anos: "Os homens são superiores pelas qualidades com que Deus as dotou..." (Sura IV, versículo 38)

José Ramos e Ramos

O tema continua em cima da mesa e eu confesso que gostei da entrevista de José Rodrigues dos Santos ao secretário geral do PCP, Paulo Raimundo.Mas Raimundo não gostou, porque lhe correu mal!  

José Rodrigo dos Santos é um extraordinario jornalista e também escritor

Em TV muitos políticos gostam de perguntas apontadas às suas ladainhas.

Mariana Mortágua crispou-se. O experiente José recuou. Deu-lhe espaço. E qual foi o resultado? Mortágua afogou-se em chavões, por falta de uma pergunta provocatória.

Em tempos idos, Álvaro Cunhal ansiava por perguntas 'afiadas' para crescer nas respostas. Depois regressava a sua bonomia gentil com os jornalistas, enxotando os desconfiados funcionários do PCP.

O tempo é escasso em TV. O formato é diferente da rádio, jornais ou revista. Como, por exemplo. o formato do Teatro, não e o da Novela.—

A pergunta da Ucrânia era central para sabermos as linhas que cozem o actual PCP. Raimundo podia aproveitar para responder em todas as vertentes.

Mas foi muito diferente de Cunhal, um homem culto. arguto, com excelente nota em Direito, artista notável e escritor de vários romances. Depois de Cunhal o PCP teve um "achim" e a seguir operários como se um partido fosse uma fábrica e uma fábrica pudesse ser dirigida por partidos.

O director de Informação  da RTP António José Teixeira veio dizer um  'talvez'. O Sindicato dos Jornalistas fez um pouco melhor.

Em rigor, a pergunta do José foi acertiva e a insistência ainda melhor. E levou inclusive a uma questão perturbadora: 

Qual é a relação de Puti-um não comunista, com o PCP? Frequentaram o mesmo restaurante? Foram companheiros de carteira? Ou são clientes no mesmo banco?

José Ramos e Ramos